SÍNDROME DE WILLIAMS-BEUREN
(Resumo para a Associação Brasileira de Síndrome de Williams-Beuren)
1. 1. Considerações históricas
Os relatos iniciais da síndrome de Williams-Beuren (SWB) foram de crianças com hipercalcemia idiopática na lactância (HIL) e descrições de estenose aórtica supravalvular (EASV) associada. Posteriormente, esses achados foram associados às características faciais peculiares e psicológicas apresentadas pelos pacientes, os quais constituem os critérios diagnósticos atuais baseados, principalmente, nas manifestações físicas e comportamentais.
WILLIAMS et al. (1961), na Nova Zelândia, publicaram os achados detalhados de quatro pacientes com EASV associada a fácies peculiar e DM. O fácies dessas crianças era característico e os autores sugeriram que se tratasse de uma síndrome não reconhecida previamente. No ano seguinte, BEUREN et al. (1962), na Alemanha, descreveram quatro pacientes com múltiplas estenoses das artérias pulmonares, anomalias dentárias, estrabismo e temperamento alegre e amigável. As características faciais eram bastante semelhantes às descritas por WILLIAMS et al. (1961), e BEUREN et al. (1962) sugeriram o diagnóstico baseado especialmente nos aspectos faciais característicos.
1. 2. Incidência
A incidência estimada da SWB é de 1: 13 700 a 1: 25 000. A maioria dos trabalhos da literatura refere-se à SWB como uma doença sem predomínio de sexo, cor ou região geográfica.
Na maioria das famílias a ocorrência é esporádica, ou seja ambos os pais são normais. No entanto, existem alguns casos familiais descritos. Em todos eles o diagnóstico do genitor afetado foi feito somente após o diagnóstico da criança afetada. A SWB também foi descrita em gêmeos monozigóticos concordantes e em gêmeos dizigóticos discordantes.
2. Quadro clínico
2. 1. Achados craniofaciais
Os achados faciais típicos da SWB incluem fronte alargada, depressão temporal, hipoplasia malar, edema supraorbitário, nariz curto e arrebitado, ponte nasal deprimida, filtro nasal longo, lábios espessos, boca grande e queixo pequeno. Estes dismorfismos faciais são reconhecíveis geralmente ao redor de quatro meses de idade, tornando-se evidentes na lactância e na infância. Na idade adulta, a face se modifica com formato alongado e lábios mais espessos. Cabelos grisalhos e enrugamento da pele podem ocorrer precocemente na idade adulta jovem.
As anomalias dentárias mais frequentes na SWB consistem em dentes pequenos (95%) e espaço aumentado entre os dentes (50%). Outras anomalias incluem raízes pequenas e finas, dentes maxilares decíduos, e atraso na mineralização. A maloclusão, que ocorre em 85% dos pacientes, é a complicação mais significativa, levando à mordida profunda ou aberta, ou mordida cruzada anterior e posterior.
A voz dos pacientes é descrita como grave ou rouca. Como a elastina é um componente importante da lâmina própria das cordas vocais, a voz grave parece estar relacionada à deficiência de elastina.
2. 2. Achados oculares
As anomalias oculares mais freqüentes na SWB incluem íris de padrão estrelado, estrabismo e tortuosidade dos vasos retinianos.
A íris na SWB foi descrita como “estrelada” ou “rendilhada e radial”. A incidência desse achado varia de 69% a 74%. A íris estrelada é clinicamente visível nos afetados de olhos azuis e detectada somente através da biomicroscopia nos pacientes de olhos escuros.
A incidência de estrabismo na SWB varia de 29 a 74%, sendo mais frequente em lactentes e crianças jovens. A esotropia infantil é a forma predominante do estrabismo nos pacientes com SWB.
O erro de refração mais comum na SWB é a hipermetropia leve a moderada, presente em 50% dos afetados e requer o uso de lentes corretivas.
Devido a elevada incidência de anormalidades oculares na SWB, recomenda-se avaliação oftalmológica completa, incluindo biomicroscopia, uma vez estabelecido o diagnóstico de SWB em uma criança. O estrabismo deve ser tratado cuidadosamente para prevenir a ambliopia, incluindo uso de tampão ocular, lentes corretivas ou cirurgia com ressecção do músculo reto medial.
2. 3. Achados cardiovasculares
As anomalias cardiovasculares ocorrem em aproximadamente 80% dos afetados. Sopros cardíacos são detectados também em torno de 80% dos pacientes com SWB, indicando a possibilidade de cardiopatia congênita.
A estenose aórtica supravalvar (EASV) é o defeito cardíaco mais frequente ocorrendo em 64% dos pacientes. A incidência de qualquer tipo de cardiopatia é de 75 a 80%.
A história natural da EASV é variável nos afetados, podendo ser uma lesão progressiva, caracterizada por aumento no gradiente de pressão do ventrículo esquerdo (VE) devido à hipoplasia da aorta ascendente. Essa anomalia é, geralmente, diagnosticada nos dois primeiros anos de vida; pode porém não ser detectada durante muitos anos, até ocorrer aumento no gradiente da pressão sistólica. Os sintomas e as complicações são semelhantes aos da estenose da valva aórtica.
A correção cirúrgica deve ser indicada, uma vez que os pacientes com gradientes de pressão significativos apresentam riscos elevados de síncope e morte súbita. Os resultados cirúrgicos imediatos mostraram baixa mortalidade e os estudos prospectivos, de longa duração, evidenciaram que a maioria dos pacientes submetidos à correção cirúrgica evoluíram bem com gradientes de pressão estáveis.
A morte súbita na SWB foi descrita inicialmente em 1961 e era uma complicação aparentemente rara com cerca de 20 casos descritos até 1996. KECECIOGLU et al. (1993) estimaram 3% de morte súbita em uma série de 104 pacientes com SWB acompanhados durante 30 anos.
Outros defeitos cardíacos que ocorrem na SWB incluem a estenose da artéria pulmonar (EAP), hipoplasia da aorta, coartação da aorta, prolapso da valva mitral (PVM) e defeitos septais. Na maioria dos casos, os pacientes apresentam mais de um defeito cardíaco, frequentemente EASV e EAP.
Na SWB podem também ocorrer estenoses localizadas e difusas da aorta torácica e abdominal, das artérias coronárias e cerebrais.
2. 4. Achados gastrintestinais
A ocorrência de dificuldade de alimentação e vômitos é frequente na lactância. O refluxo gastroesofágico (RGE) pode ser a causa dessas manifestações.
MORRIS et al. (1988) observaram que dois-terços dos recém-nascidos com SWB manifestavam cólicas intestinais com uma duração média de 7,4 meses. A obstipação foi observada em 43% (18/42) das crianças podendo levar a prolapso retal.
2. 5. Achados renais e urinários
A incidência de anormalidades renais na SWB é de aproximadamente 18% (PANKAU et al., 1996). As anomalias renais e do trato urinário incluem ectopia, agenesia ou hipoplasia renal, duplicidade pielocalicial, rim em ferradura, hidronefrose, nefrocalcinose, estenose da artéria renal, megaureter e estenose da junção uretero-pélvica. Os divertículos de bexiga são frequentes na SWB: 60% nas crianças e 75% nos adultos.
As anormalidades funcionais incluem proteinúria, insuficiência renal, refluxo vesico-ureteral e disfunções vesicais caracterizadas por hiperatividade detrusora.
A hipertensão arterial (HA) é um achado comum na SWB. A frequência eleva-se com a idade: 5% em crianças jovens e 63% em adultos acima de 18 anos. A HA pode ser secundária à estenose das artérias renais.
2. 6. Hipercalcemia
Apesar da associação histórica da SWB com HIL, sua ocorrência é documentada em somente 15% dos afetados e desaparece até o final do segundo ano de vida. A ocorrência na lactância pode ser até 40%, porém na maioria dos pacientes, a hipercalcemia não é documentada (MORRIS, 2001).
As principais manifestações consistem em dificuldade de crescimento, vômitos excessivos, anorexia, irritabilidade, cólicas, obstipação ou acometimento renal. Em alguns casos, a hipercalcemia pode surgir novamente na infância e na adolescência.
2. 7. Achados no sistema músculo-esquelético
A hipermobilidade articular é observada em 90% dos pacientes durante a lactância podendo contribuir para o atraso na deambulação. Contraturas articulares, especialmente dos membros inferiores, são descritas em 50% das crianças e 90% dos adultos afetados.
A limitação à supinação do antebraço com ou sem sinostose rádio-ulnar pode estar presente em 10% dos pacientes com SWB. A limitação resultante da sinostose é variável, podendo afetar a escrita. A correção cirúrgica está indicada quando ocorre uma limitação significativa.
A fisioterapia pode auxiliar na melhora das contraturas articulares se for iniciada em fase precoce e mantida por período prolongado. Se os pacientes não receberem tratamento, as contraturas agravam-se com a idade. A limitação à supinação parece não melhorar com fisioterapia ou mesmo com cirurgia.
Outras anomalias comuns incluem escoliose (12%), cifose (21%) e lordose (38%). Anomalias menores de extremidades também foram descritas com frequência na SWB: hálux valgo (78%), unhas hipoplásicas (67%) e clinodactilia do quinto dedo (42%).
2. 8. Alterações do crescimento e da puberdade
Na maioria dos afetados, há deficiência do crescimento de leve a moderada desde a fase pré-natal e deficiência mais acentuada após o período pós-natal. Os recém-nascidos com SWB apresentam peso de nascimento inferior ao da população geral, 2830g em média. Geralmente, o peso permanece baixo durante a lactância devido a dificuldades na alimentação e problemas gastrintestinais, porém melhora durante a infância e permanece dentro dos limites normais nos adultos.
A baixa estatura é observada em aproximadamente 50% dos afetados pela SWB. O déficit de crescimento associado à dificuldade de ganho de peso é mais acentuado na lactância e na infância. MORRIS et al. (1988) verificaram que a estatura frequentemente encontra-se abaixo do quinto percentil da curva de crescimento até quatro anos de idade, seguida de recuperação mais tarde na fase pré-escolar. A maioria dos adultos alcançam as medidas de estatura dentro dos limites inferiores da curva de crescimento. MARTIN et al. (1984) observaram que a estatura média dos adultos homens é de 159cm e das mulheres, 147cm.
A causa da redução no ganho de estatura é desconhecida. Os estudos hormonais revelaram que os níveis do fator de crescimento insulina-like (IGF1) estão normais na maioria dos indivíduos com SWB. Esses achados sugerem que a deficiência do hormônio de crescimento não seria a causa da baixa estatura. Apenas em um afetado pela SWB da literatura foi documentada a deficiência de hormônio de crescimento.
Apesar dos pacientes com SWB apresentarem uma sequência normal de desenvolvimento pubertário, o início da puberdade geralmente ocorre mais cedo do que na população normal. No estudo de PANKAU et al. (1992), a idade média da menarca em 28 meninas afetadas pela SWB foi de 11, 6 ± 1,5 anos; enquanto nas meninas normais de Zurich, na Alemanha, a menarca ocorreu em média aos 13,4 ± 1,1 anos de idade.
O desenvolvimento sexual em meninos também ocorre mais cedo do que o esperado.
O perímetro cefálico (PC) dos pacientes com SWB é inferior ao da população normal. PANKAU et al. (1994) avaliaram 63 meninas e 88 meninos afetados pela SWB desde o nascimento até a idade adulta. A média do PC ao nascimento foi de 33, 39 cm e 34, 02 cm nos recém nascidos de termo do sexo masculino e feminino, respectivamente. Apesar da velocidade de crescimento do PC nas crianças com SWB ser baixa, o padrão de crescimento é semelhante ao da população normal. A microcefalia foi observada em um terço dos afetados pela SWB e pode persistir em alguns pacientes.
2. 9. Achados de SNC, alterações neurológicas e comportamentais
No primeiro ano de vida, a hipotonia muscular é frequente, levando ao atraso no desenvolvimento motor. A deambulação é atrasada e as crianças andam em média aos 21 meses de idade. O tônus muscular melhora com a idade; e em alguns casos, pode ocorrer hipertonia. Além disso, incordenação motora, reflexos tendinosos profundos hiperativos podem estar presentes na infância e permanecer até a idade adulta.
A deficiência mental (DM) está presente em todos os pacientes. O coeficiente de inteligência (QI) varia de 41 a 80. Algumas crianças são mais afetadas que outras, porém a maioria encontra-se na faixa de DM(Deficiência Mental)leve a moderada. A DM na SWB está associada a um perfil cognitivo e linguístico distinto, caracterizado por capacidade linguística relativamente preservada, porém com déficit visio-espacial. Na lactância, as crianças apresentam atraso na linguagem e começam a enunciar frases após os três anos de idade. Posteriormente, a comunicação verbal melhora bastante. A memória auditiva e o processamento verbal estão frequentemente bem desenvolvidos e a capacidade de expressão da linguagem está intacta. Em comparação a outros pacientes portadores de DM com QI semelhantes, as crianças com SWB falam com maior fluência, possuem vocabulário mais extenso e são bons conversadores. O grau de compreensão pode ser limitado e o conteúdo do discurso pode ser anormal, com uso inadequado de frases estereotipadas.
As deficiências em tarefas não-verbais como cognição visio-espacial, manipulação de números, solução de problemas e planejamento motor tornam-se mais evidentes posteriormente e não melhoram com a idade. As crianças afetadas apresentam dificuldade na compreensão de conceitos matemáticos, temporais, de distância e de velocidade. No entanto, a capacidade de reconhecimento facial permanece intacta e as crianças são capazes de reconhecer os familiares e distinguí-los de pessoas estranhas.
O volume do cérebro de pacientes com SWB corresponde em média a 80% do tamanho de um cérebro normal. Crescimento excessivo do neocerebelo, desenvolvimento normal das estruturas do córtex frontal e do sistema límbico e do lobo temporal posterior também foram observadas.
3. Prognóstico
Apesar dos adultos com SWB continuarem a exibir as manifestações características da síndrome, a gravidade dos problemas médicos pode ser variável. Mais de 70 adultos já foram avaliados e seus problemas são progressivos. Incluem geralmente complicações cardiovasculares, infecções urinárias recorrentes, problemas gastrintestinais, hipercalcemia e limitação progressiva de movimentação nas articulações.
MORRIS et al. (1990) avaliaram 13 adultos (7M: 6F, de 17 a 45 anos) com SWB e reviram 16 casos previamente descritos por outros autores com idade superior a 16 anos. As complicações cardiovasculares foram frequentes e incluíram: HA (8), EASV (9), hipoplasia da aorta (3), EAP (4), estenoses periféricas (3) e PVM (2). A HA era de difícil controle medicamentoso. Os problemas gastrintestinais incluíam obesidade (5), obstipação crônica (7), diverticulite (3) e colelitíase (4). As infecções urinárias recorrentes foram descritas em seis pacientes. Dois apresentavam estenose da uretra e divertículo de bexiga e três, RVU. As contraturas articulares observadas (12) eram progressivas, com limitação das habilidades motoras finas e frequentemente acompanhadas de cifoescoliose e lordose. Três adultos apresentavam calcificação dos ligamentos petroclinóides e um indivíduo de 19 anos, calcificações na aorta abdominal. Esses depósitos ectópicos de cálcio e a hipercalciúria nos adultos demonstraram que o distúrbio no metabolismo do cálcio não desaparece com a idade na maioria dos casos. O QI médio dos pacientes foi de 53 (17-87). Somente um afetado trabalhava e morava independentemente. Os outros residiam com os pais, em instituições ou em moradias supervisionadas.
DAVIES et al. (1997) estudaram 70 adultos de 19 a 39 anos, idade média de 26 anos, registradas na Williams Syndrome Foundation do Reino Unido quanto aos aspectos comportamentais envolvendo adaptação, independência, habilidades e ocupação. A média do QI foi de 62; a maioria dos indivíduos (84%) apresentou QI entre 50-70; oito (11%) entre 71-80 e 3(4%), inferior a 50. A adaptação era significativamente inferior à idade cronológica. Vinte por cento dos afetados requeriam assistência ou supervisão no uso do banheiro e metade deles necessitavam de auxílio para se lavar e se vestir. A maioria deles lia e escrevia em níveis básicos. Quatro indivíduos trabalhavam sob supervisão: dois como ajudantes de supermercado, um como ajudante de cozinha e um como empacotador.
Somente 20 adultos (29%) recebiam cuidados médicos anuais. Cerca de 30% deles haviam passado por, no mínimo, uma consulta médica na idade adulta, enquanto 29 (41%) não foram examinados uma única vez sequer nessa faixa etária. Dos 20 adultos examinados regularmente, dois foram submetidos a transplante renal, um necessitou de transplante cardíaco e nove eram hipertensos. Os 10 restantes recebiam avaliação cardíaca anual e suas atividades diárias não eram interrompidas por HA ou problemas cardíacos. Problemas intestinais como prolapso de reto, hemorróidas, diverticulite e obstipação foram relatados por 14 dos 20 indivíduos. As complicações articulares referidas foram luxação de joelhos (9), dores em membros (30) e escoliose (5). Em 36 das 37 mulheres foram descritas dismenorréia e tensão pré-menstrual.
Os níveis de cuidados próprios e de independência nos adultos com SWB parecem ser limitados menos pelas incapacidades físicas do que pelas características comportamentais e psicológicas associadas a SWB que são a ansiedade, a tendência à distração, a amistosidade excessiva, à falta de persistência e à incoordenação motora grossa e fina.
4. Etiologia
A causa da SWB era desconhecida até a década de 90.
No ano de 1993, EWART et al. (1993) estudaram cinco casos esporádicos e quatro familiais de SWB e concluíram que ela é causada por deleções submicroscópicas na região 7q11.23. A hemizigosidade no lócus do gene da elastina, resultante da deleção, foi identificada nos nove pacientes, pela técnica da hibridização in situ com fluorescência (FISH) utilizando-se a sonda da elastina genômica pELN5-4.
Com esses dados, os autores sugeriram que essa deleção, seria a causa das alterações vasculares e do tecido conjuntivo que ocorrem na SWB, como hérnias, envelhecimento precoce da pele, hiperextensibilidade articular na infância, voz grave, divertículos de bexiga e do intestino e dismorfismos faciais (tecido conjuntivo frouxo supraorbitário, bochechas proeminentes e lábios espessos). No entanto, as alterações comportamentais e neurológicas da SWB não puderam ser explicadas pela deleção no lócus do gene da elastina.
4.1. Teste da hibridização in situ por fluorescência (FISH) na SWB
A hibridização in situ é uma técnica citogenética que permite a localização de uma seqüência específica de ácido desoxirribonucléico (DNA) numa banda cromossômica. Isto pode ser realizado somente se a sequência clonada de DNA, ou seja uma sonda, estiver disponível. Atualmente, este método tem se mostrado altamente eficiente para a detecção de microdeleções em pacientes com SWB ou outras patologias nas quais as microdeleções possam estar envolvidas.
A técnica consiste na hibridização de uma sonda marcada com corantes fluorescentes ou radioativos, para identificar o seu segmento complementar dentro de uma metáfase cromossômica espalhada numa lâmina. O DNA dos cromossomos metafásicos é desnaturado na própria lâmina (daí a técnica ser denominada de in situ), iniciando-se, a seguir a hibridização com a sonda marcada. A sonda é visualizada por fluorescência, no caso da técnica de FISH, ou por um filme de raio X.
4. 2. Aspectos moleculares da SWB
Os avanços na genética molecular, particularmente a técnica de FISH e o desenvolvimento de polimorfismos de comprimento dos fragmentos de restrição (RFLP) facilmente identificáveis, permitiram a detecção de deleções muito pequenas, inferiores a 5 megabases (Mb) não identificadas a nível microscópico anteriormente. Elas são denominadas de microdeleções e como também envolvem deleções de uma série de genes adjacentes, são chamadas de síndromes de genes contíguos. As consequências fenotípicas podem ser o resultado dos efeitos aditivos da hemizigosidade e/ou duplicação de alguns genes. Espera-se assim, que ocorra um espectro fenotípico para cada uma dessas condições, diretamente relacionado à extensão da região deletada e/ou duplicada.
Atualmente, a SWB é considerada uma síndrome de deleção de genes contíguos da região 7q11.23 (braço longo do cromossomo 7).
A maioria dos afetados pela SWB apresenta deleções superiores a 500kb (quilobases), em torno de 1 Mb (megabase), estendendo-se na região 7q11.23.. Mais de 15 genes já foram identificados na região 7q11.23, além do gene da elastina, e os pesquisadores estão tentando determinar o papel de cada um deles nas manifestações da SWB.
O gene da elastina, localizado no lócus 7q11.23, consiste de 34 exons e ocupa 47kb do DNA genômico. Ele codifica a proteína elastina que é encontrada no tecido arterial em camadas paralelas separadas por camadas de músculo liso.
O segundo gene mais frequentemente deletado nos pacientes com SWB é o gene LIM-Kinase 1 (LIMK1). Esse gene, expresso no sistema nervoso central, seria responsável pelo perfil cognitivo distinto da SWB caracterizado pela deficiência de integração visio-motora.
O gene WBSCR14/WS-bHLH é considerado atualmente um dos genes críticos da SWB. Ele codifica um polipeptídeo que pertence a uma subclasse de fatores de transcrição chamada basic-helix-loop-helix leucine zipper (bHLHZip), que por sua vez pertence à superfamília Myc/Max/ Mad. Estes fatores de transcrição estão relacionados a várias funções das células eucarióticas como proliferação, crescimento, diferenciação e apoptose celular. Desse modo, vários estudos sugerem que o gene WBSCR14 estaria envolvido no controle do crescimento.
5. Diagnóstico da SWB
A suspeita diagnóstica da SWB é essencialmente clínica baseada nos achados de exame físico, já descritos no quadro clínico, e nos exames complementares.
O teste de FISH (que utiliza as sondas do gene da elastina e da LIM Kinase 1), é positivo em cerca de 90 a 96% dos pacientes com SWB confirmando o diagnóstico.
Acreditamos que nos pacientes com quadro típico da SWB, o teste de FISH não seria imprescindível, principalmente nos hospitais da rede pública, uma vez que o custo do teste é muito elevado no nosso meio. Mesmo em países desenvolvidos, o teste de FISH é dispendioso. Em um estudo recente, ST HEAPS et al. (2001), ponderam que os médicos deveriam realizar uma seleção clínica mais criteriosa para solicitar o teste de FISH. O custo do exame, de $US290, em pesquisa realizada pela Australasian Society of Cytogenetics, foi considerado elevado.
SUGAYAMA (2001) elaborou um sistema de pontuação baseada na presença ou ausência de 15 características clínicas para auxiliar na suspeita diagnóstica da SWB.
Tabela 1. SISTEMA DE PONTUAÇÃO PARA SUSPEITA CLÍNICA DA SWB
Baixo peso ao nascimento – 3
Dificuldades alimentares – 3
Obstipação – 3
Fácies típico – 3
EASV – 3
DM – 3
Personalidade amigável – 3
Estrabismo – 2
Atraso de DNPM – 2
Dificuldade de ganho de peso – 1
Outra cardiopatia que não a EASV – 1
Hipertensão arterial – 1
Contraturas articulares – 1
Hiperacusia – 1
Hipoplasia ungueal – 1
Total 31
Para cada uma das características presentes atribuiu-se os pontos especificados na tabela acima e, no final, soma-se os pontos. O teste de FISH estaria indicado nos indivíduos afetados com a soma total com valores inferiores a 20 pontos.
Acreditamos que esse sistema de pontuação traria uma contribuição no sentido de indicar o teste de FISH para aqueles casos com suspeita duvidosa.
6. Aconselhamento genético
A SWB é considerada uma síndrome de deleção de genes contíguos, de herança autossômica dominante (OMIM #194050). A grande maioria dos casos de SWB são esporádicos, ou seja, os genitores são normais e trata-se do primeiro caso na família. Nestes casos, o risco de recorrência é desprezível.
No entanto, os afetado(a)s apresentam um risco de 50% de terem filho (a)s com a mesma patologia, uma vez que a herança é autossômica dominante.
Dra. Sofia M. M. Sugayama – Médica formada pela FMUSP, Doutorado em Medicina pela FMUSP, Título de Especialista em Pediatria e Genética Clínica conferido pelo CFM (Conselho Federal de Medicina) e AMB (Associação Médica Brasileira).
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Médica formada pela FMUSP, Doutorado em Medicina pela FMUSP, Título de Especialista em Pediatria e Genética Clínica conferido pelo CFM (Conselho Federal de Medicina) e AMB (Associação Médica Brasileira)