A difícil descoberta da SW
Jô Nunes esperava por seu bebê ansiosamente, pois era uma menina. Os médicos diziam que ela tinha feito as contas erradas, porque a criança pesava menos do que seria normal naquele período da gestação. Ela nasceu em outubro de 1990 com 2,65 kg e com Síndrome de Williams.
Até então, Jéssica seria só mais um bebê pequeno. Mas ao voltar para casa, Jô percebeu que algo estava errado. “Ela chorava dia e noite e muito forte, foi quase oito meses sem dormir e na maternidade percebi que a feição dela era diferente, mas o pediatra garantiu que estava tudo normal”.
O choro era interrupto, diversas vezes a mãe buscava por pronto-socorro pela madrugada e sua filha era medicada por estar com cólica. Essa dor, comum aos recém-nascidos, era o primeiro aviso sobre a síndrome.
Os sinais
Uma criança com Síndrome de Williams apresenta choro constante por estar com cólicas devido ao excesso de cálcio (hipercalcemia) em seu organismo. O quadro clínico de quem tem a doença é delicado, pois apresentam cardiopatia congênita (estenose aórtica supra valvar, estenose pulmonar – “sopros cardíacos”), dificuldades alimentares, vômitos persistentes e deficiência intelectual. Chong Ae Kim, chefe da unidade de genética do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas de São Paulo (ICR/HCSP), alerta que algumas crianças não apresentam cardiopatia, contudo não afasta esse diagnóstico.
Jéssica, até os quatro meses de vida, teve quatro pneumonias. Jô Nunes, que já desacreditava dos pediatras que frequentava, decidiu procurar por um hospital mais especializado e uma médica famosa na época. Literalmente precisou invadir o hospital para chegar até a chefe da pediatria. Muito nervosa, Jô suplicava por ajuda. Então, a médica a levou ao consultório para acalmá-la. Ao colocar a pequena na maca para examiná-la, Jéssica teve uma parada cardíaca. Levada as pressas para a UTI, foi diagnosticado seu problema cardíaco e transferida para o Instituto do Coração de São Paulo (Incor).
O que é Síndrome de Williams?
Uma doença genética causada pela desordem do cromossomo7, devido à perda de parte dos genes no braço longo desse cromossomo (deleção 7q11.23 – perda do fragmento). Porém, a sua transmissão não é genética.
Aos seis meses ela foi encaminhada a uma cirurgia para tirar a hérnia e, na primeira consulta, o médico ouvindo o relato da mãe, encaminhou a Jéssica para um geneticista. “No dia da consulta, o geneticista a examinou e me mandou esperar lá fora. Ficou impaciente, porque a Jéssica chorava o tempo todo e falou para o meu marido que ela era perfeita, que o problema era eu e me encaminhou a um psiquiatra”.
Maria Dolores Fortes, psicopedagoga, pós-graduada em Distúrbios da Aprendizagem pela Universidade de Buenos Aires (UBA) e especialista em síndromes, alerta que há sinais visuais em crianças com Síndrome de Williams. “Digo aos meus colegas educadores que devem se atentar para pequenos alunos que apresentam personalidade extremamente sociável, mesmo com estranhos, menor tamanho do que o esperado para a idade, baixo timbre de voz, traços faciais característicos (o aspecto da íris, o estrabismo, os lábios grossos e o sulco naso-labial), no entanto, só se fazem mais evidentes quando a criança já é maior.
Diagnóstico
Com a cardiopatia, diversos cuidados passaram a ser tomados e Jéssica passou sua infância sendo consultada por uma equipe multidisciplinar. Chegou a se tratar com 19 médicos por mês. Porém, não havia explicação para o motivo das doenças, até então ela ainda não tinha o diagnóstico correto.
“Ao ser diagnosticada corretamente senti o alívio, sabia agora o que minha filha tinha após sete anos de dúvidas”
(Jô Nunes)
Em mais um dia de hospital, Jô Nunes levou a filha ao Incor para realizar o exame de Ecocardiograma. Jéssica, sempre agitada, improvisou um microfone com uma folha de papel, subiu em uma cadeira e começou a cantar. A música era uma das suas paixões. “Sentei longe e fingi que não a conhecia, estava exausta com toda a situação e não adiantava fazer ela ficar quieta, porque só piorava, ficava nervosa e chorava.
Passaram dois moços de jaleco branco (acredito que eram médicos) e, ao verem a menina, um comentou com o outro “Williams Syndrome”. Quando eu ouvi me levantei e segurei na mão de um dos rapazes. Comecei a perguntar se tinha alguém ali que falava inglês e apareceu outro rapaz que passou a traduzir a conversa. Um dos rapazes americanos falou que a Jéssica tinha a síndrome e me aconselhou para procurar um geneticista”.
Ali começava a luta para conseguir o encaminhamento para o especialista. Todos os médicos de Jéssica argumentavam que ela não tinha nada genético e, sim, sequela de meningite que teve na primeira infância. De tanto insistir, Jô conseguiu o documento e foi direcionada para o setor de genética do Instituto da Criança. A vaga para consulta demoraria dois anos. Então, a mãe passou a ir todas as segundas e quintas-feiras no hospital para conferir se havia encaixe. Em tantas idas acabou conhecendo a médica Sofia Miura, que apresentou a doutora Chong Ae Kim, que submeteu Jéssica a uma equipe para analisá-la.
Para a confirmação do quadro, Chong disse à mãe que era necessário o exame de sangue específico, o cariótipo nos glóbulos brancos do sangue (linfócitos), complementado pela técnica de hibridação in situ (FISH) para os genes daelastina (ELN) e da L1Mquinase, que costuma ser positivo em 90 a 96% dos casos. Jô pagou por esse exame e encontrou a luz no fim do túnel.
“Ao ser diagnosticada corretamente, senti alívio. Sabia, a partir daquele momento, o que minha filha tinha após sete anos de dúvidas e agravamento de doenças. Além de provar que não era louca e que não era cisma de mãe que mimava o filho”.
Após o diagnóstico, a criança com síndrome deve ser consultada por um geneticista, que será o médico centralizador que irá indicar outras especialidades médicas, conforme a necessidade que o paciente apresentará. Entre eles, estará o cardiologista, fisioterapeuta e fonoaudiólogo.
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